O morto-vivo
Este homem que encontro todos os dias, acha-se deitado sobre o chão da rua, esperando que as pessoas passem sobre ele, como se fora, ele mesmo, um quase morto. Não aprecia o contato com os outros ou com o mundo dos vivos. Passa-se como uma coisa qualquer, um sem-mãe que seja ou que nunca haja tido uma para ensiná-lo a vida. De outro modo não haveria sido o que se tornou: uma pessoa desprezível no mesmo grau e medida que despreza os outros. Vi-o, como sempre o vejo e por essa razão não cogitei perguntar por que se acha ali, estendido, barriga para cima, com um olhar vago de quem não sente, não aprecia nada e nem ama coisa alguma. Para que confirmar o que eu já sei? Há dias para os que passam, mas há anos a mim, que já o venho sondado, que a sua vida é um restinho de respirar, ler coisas que se refiram a desejos fortuitos e seus apenas, e mover-se em torno de assuntos redundantes sobre novidades que o mantenham cada vez mais, em apurado narcisismo. Tenho-lhe pena, confesso. Mas,