Como São Tomé

Um dia de chuva e frio e a notícia do suicídio de um conhecido conterrâneo, torna o tempo melancólico. Articulo pensamentos e impressões sobre o fato, enquanto os pingos d'água tamborilam no jardim. Em volta, o tempo escureceu rapidamente, e eu pareço mergulhar em um oceano vasto, desconhecido e misterioso. 

O das indagações, para as quais, talvez, nunca tenhamos respostas. É como querer contar estrelas que estampam o céu cintilante. As noites de chuva negam que elas existam. Em dias comuns de estio, os luzeiros lá em cima nos enganam porque nos vendem luminosas ilusões. 

Tantas já morreram, mas continuam acesas. São fantasmas delas mesmas. Luzes que já se apagaram. Ver o que não mais existe é mentira ou mistério? Se eu vejo, eu creio. Que nem São Tomé, eu creio, porque seu brilho encandeia minhas retinas. É nessas horas, que eu desejo continuar desconhecendo geofísica, astronáutica e astrodinâmica. 

Escolho deliberadamente continuar pensando, como se não soubesse, sobre  o que a Ciência sabe decifrar e já tem resposta. Não quero vereditos, nem saber sobre males, no oráculo do conhecimento, que antecipa a minha condenação. Basta-me saber da inevitabilidade da morte, como cerimônia e sagração de um mistério. Quero a salvadora ignorância ingênua dos mais antigos. 

Saber demais tira da vida o que ela tem de melhor: viver livre dos flagelos. A consciência científica encurrala a fantasia e dá socos na imaginação. Faz-me carregar um saco de medos, pesados que nem pedras, sobre as costas. Prefiro a santificação das crendices. Pelo menos hoje, prefiro. Invalido precauções e cautelas. Todas. Não perco meu tempo em decifrá-las. Eu também sou mistério.

Inauguro leveza em vez de angústia. Ser exato é como roubar a mim, meu próprio mergulho, e profanar o templo do meu sagrado naufrágio, no mar de luzes mentirosas. Sou viajor suicida da racionalidade, nesse espaço de viajantes estrelas fantasmas. Mesmo que uma noite de chuva como a de hoje, as negue, eu creio; elas estão lá.

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