O Gato

A cama sobre a qual deitara tinha um cheiro de naftalina e resquícios de alfazema. Tinha também, apurando o olfato, fragrância de leite de colônia em alguma parte da colcha, onde inalava-se uma constelação simbólica de afetos. Dormia-se um sono breve e tardio, fora de hora. Um cochilo daqueles que se nos roubam os olhos pesados. Havia fitado por alguns minutos, quatro elegantes gueixas, de porcelana branca em trajes típicos, sobre uma pequena prateleira, cujo fundo suave, tinha flores vermelhas e pequenas rosas em decupagem . Preparavam-se as gueixas para tocar. Chegou mesmo a ouvi-las afinando seus instrumentos. Mergulho profundo. Acordou com uma das mãos dormente e meio aérea, como quem em viagem, abre os olhos sem saber onde está. E quem sabe mesmo onde se está em certas horas? A cama  sobre a qual sonhara exalava esquisitice. Voltara do reino dos sonhos. De um não-sei-quê e de um nunca ter estado em um lugar de onde se sente imensa saudade. Aonde iria depois daquele estranho sonho, onde um gato pulara em seu colo? Manso. Era tão manso, que só de olhá-lo, expunha-se ele, humilde, a querer ser amado.

Comentários

  1. Goretti, parabens!! Gostei muito. Acontece-nos muito.A diferença está em externar com maestria, transformando em poesia um novo dia que amanhece.

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