Quinta grandeza



Estava dentro do carro fazendo uma viagem inesperada. Assim é que é bom, quando a gente não acerta nada e tudo dá certo. A estrada era de barro e muito esburacada. O caminho tinha paisagem de securas, porém exótica dada à vegetação típica do sertão. Do lado direito a agressiva e mesmo assim, bela flora. Do lado oposto, o rio seguindo seu curso. Experimentava e até que enfim, o sentido mais real do que queria dizer a palavra geografia. 

Acertando-se às lembranças, viu-se na escola primária, o caderno cheio de anotações, e depois o penoso exercício de decorar o significado da palavra e suas extensões. Determinismo geográfico, os quatro pontos cardeais, as quatro estações do ano, os tipos de clima, os limites da pequena cidade, o número de seus habitantes. Flora e fauna. Os movimentos da Terra, seu eixo e a força da gravidade. Os astros, luminosos e iluminados.

Em um daqueles dias em sala de aula, quando ao sol fora atribuído à ordem de quinta grandeza, e revelou-se ser ele uma estrela incandescente, chegou em casa e eufórica contou a novidade. Desapontada, viu que a novidade não era novidade nenhuma. Todos os adultos da casa já  o sabiam. Inquietou-se achando impossível que diante de tamanha grandiosidade daquele astro celeste, jogando labaredas na nossa galáxia e ostentando-se sobre nossas cabeças, não fosse causa de reverência diária, espanto, nem admiração para ninguém. A si causara um misto de medo e respeito, e pela primeira vez, mensurou-se corretamente como coisinha pouca, um tiquinho de nada, ante aquilo que colocara o mundo, como sendo um tão pequeno lugar, dentro do imensurável espaço . À infinitude ocorrera-lhe - para entender melhor - a comparação com os números, por serem também sem-fim e supôs que, a Matemática e Deus eram cúmplices.

Os sacolejos causados pela buraqueira, precipitaram-se à dissipação de outros pensares consequentes, que já se aprumavam enfileirados à ordem das associações, e que se assim não tivessem sido interrompidos, a teriam abstraído do tempo e às coisas imediatas. Voltou-se, e olhando pela janela, viu a corrida das árvores retorcidas, os galhos secos, as folhas amareladas, os cactos espinhosos, escutando o converseiro animado dos outros passageiros.  Não tardou e logo adiante, as casas foram-se sobrepondo à poeira e o povoado mostrou-se alegre, com sua gente enfeitando as portas. O grande luzeiro, estampado no límpido céu azul, lançou brilho sobre os telhados e viajantes e esparramou-se pelas calçadas. Por sua vez o automóvel despediu-se dos passageiros, sob o aviso abrupto dos freios, que anunciaram o fim da viagem. Então, cada um caminhou sozinho para a sua jornada. Sobre o calçamento seus passos marcavam no chão, aquela trilhazinha que todo destino deixa.




Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Com quase sessenta

Rabeando

Sem Assunto