A Anti-fantasia de Martin Scorsese: Entrevista com o jornalista Ranieri Brandão
A crítica e o debate sobre cinema em Maceió. Existem?
Ranieri Brandão e Ricardo Lessa são jovens jornalistas, criadores e editores da revista virtual FILMOLOGIA, que além da profissão, têm em comum, o amor pelo cinema. Aliás, um amor apaixonado, que faz com que tenham se atrevido, esta é a palavra mais acertada, a desenvolverem um projeto para discutir cinema em Maceió. E discutir cinema em Maceió é mesmo um desafio. Parece que a arte cinematográfica, ou seja; a importância do cinema como canal que expressa de modo bem abrangente, todas as outras artes, e as contradições humanas existentes, ainda não foi ‘descoberto’ como lugar de debate, inclusive, pelos meios culturais e pela mídia da capital alagoana. Fala-se sobre filmes, sinopses. Não sobre o Cinema. A própria ‘crítica’ que se diz ser feita em Maceió – me refiro à crítica dos jornais impressos locais, em especial -, a que é feita principalmente pelos jornais que se destacam pelo alto índice de leitores, não poderia ser chamada de crítica, porque sejamos sinceros, está ainda em fase embrionária, infelizmente. Em sua quarta edição, a nova Oficina traz para o debate: A Anti-fantasia de Martin Scorsese, que será realizada nos dias 13,14 e 15, das 10h às 12h, no Cine Sesi Pajuçara. Seria interessante que os críticos de cinema da mídia impressa alagoana participassem. Vale a pena.
Ensaio Geral - Como surgiu a idéia de oferecer as oficinas de cinema ao público interessado de Maceió?
RBrandão – Na verdade, essa é uma ideia que Ricardo e eu roubamos. Os críticos do sul do país fazem muitas oficinas em seus estados. É um meio muito eficiente de conversar sobre cinema e, em se tratando de Maceió, de localizar as pessoas que gostam e que, por um motivo ou por outro, não temos a chance de encontrar em sessões de cinema ou coisas do gênero.
Ensaio Geral - Como sabemos, o cinema é arte. Como os grupos voltados para a cultura alagoana se comportam quando o assunto é cinema?
RBrandão - Bom, sem querer generalizar, a atenção dispensada ao cinema em programas “de cultura” feitos em Alagoas é um tanto displicente. Nesses programas, sempre divulgadores de nomes pouco conhecidos, o valor é dado mais para quem produz música ou pintura. Quem escreve é chamado quando é um escritor de livros. O papel do crítico, tanto nos nossos jornais quanto na nossa sociedade, precisa urgentemente ser criado (sim, criado, porque ainda hoje temos só um nome por aqui, o de Elinaldo Barros), para, depois, ser valorado e receber a atenção que merece. É muito simples assistir a um filme e se tornar fã dele. Difícil é debatê-lo. É isso que falta, como um todo (não só com o cinema, mas com as outras formas de expressão), aqui em Maceió.
Ensaio Geral - Você acha que as pessoas absorvem o cinema como arte, assim como o teatro, as artes visuais?
RBrandão - Acredito que sim, mas em parte. Com as oficinas aprendemos junto com o público a absorver mais e mais as coisas do cinema. Fora das oficinas (e não estou dizendo que as oficinas salvam Maceió de forma alguma; assim também como o Filmologia não salva: se tratam só de espaços algo inéditos) vejo que o cinema e as outras artes parecem funcionar mais como certo tipo de status. Por exemplo, para fazer parte de um grupo em específico há de se gostar de cinema, de certo tipo de música, de certo tipo de roupa, de certo tipo de comportamento. O cinema, hoje, em Maceió, numa observação minha bem superficial, aviso, me parece vir associado antes ao status mesmo, à figura que representa na sociedade. São geralmente esses que dizem gostar muito de Almodóvar, por exemplo, que não apareceram na oficina que Ricardo e eu realizamos. Almodóvar acaba por se tornar uma grife que faz parte de uma personalidade e não um cineasta a ser debatido.
Ensaio Geral - Como jornalistas apaixonados pelo cinema, você e Ricardo, percebe-se, têm trabalhado em função de criarem um público que dê a arte cinematográfica a sua devida atenção e consequentemente, o seu lugar, aqui em Maceió. Quais as dificuldades encontradas?
RBrandão - As dificuldades de sempre: encontrar o público e debater com ele, fazê-lo perder a timidez. Demos dois tiros no escuro, Ricardo e eu. O primeiro foi inventar de fazer as oficinas aqui em Maceió, coisa inédita, que ninguém tinha feito antes. Digo, oficinas sobre cineastas, seus cinemas, sobre o debate. Corremos para o Marcão (gerente do SESI) que, de pronto, “comprou” nossa ideia. Ficamos à espera do público, como ficamos até hoje. Sempre é uma alegria e uma tristeza quando vemos os mesmos rostos nas oficinas, como se o público de cinema fosse somente aquele aqui na nossa cidade. O segundo tiro foi termos criado o Filmologia aqui, com redatores daqui, que nem sequer sabíamos se tinham prática com a crítica. Ainda bem que estamos começando a pegar um ritmo agora. Resumindo, nossas dificuldades todas são baseadas no encontro com o público.
Ensaio Geral - Quem frequenta as oficinas?
RBrandão – Geralmente estudantes, universitários. Um pessoal da nossa mesma faixa etária. Mas aparecem pessoas acima dessa faixa, claro, e, geralmente, entabulam ótimos debates, que deixam a oficina bem viva. Perguntam, questionam, duvidam. É muito bom e produtivo. Na oficina sobre Pedro Almodóvar foi até um senhor, já com mais de 50, creio. Ele ficou calado durante os três dias, mas foi uma presença inesquecível para Ricardo e eu, porque vimos que a oficina começara, ali, a estender mais um pouco o alvo de seu público.
Ensaio Geral - O que é que esse público busca, enfim?
RBrandão - Acho que informação com formação. A notícia e a opinião. Resumindo, creio que nosso público procura mesmo uma boa conversa, e procura algo que sacie sua curiosidade (temporariamente, porque Scorsese, nosso cineasta da próxima oficina, parafreaseia Frank Capra e diz que o antídoto para o cinema é sempre mais cinema) e que o deixe mais afinado com as ideias dos cineastas abordados.
Ensaio Geral - Para encerrar gostaria que você falasse um pouco sobre a oficina que está para acontecer...
RBrandão - Bom, sem dúvida essa será a oficina mais épica que realizaremos. Ou que realizamos até hoje. Serão 35 filmes abordados, dos 43 que Scorsese dirigiu desde 1959. Começaremos em 1963 e vamos concluir com 2010, com A Ilha do Medo, o longa recente de Scorsese. Claro que não poderemos falar detalhadamente sobre todos esses filmes. Falaremos dos mais urgentes, embora as questões pertinentes no cinema de Scorsese estão em todos os seus filmes e isso pode gerar algum interesse inédito em algum filme pouco conhecido. Vai depender, logicamente, da participação do público e de seu interesse. Esperamos que seja a melhor de todas as oficinas. Não em termos de público, mas em termos de debate e de informações trocadas entre nós, instrutores, e eles, o público.
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